A CADA NEGRO... - Reflexão

      Imagino que a cada acontecimento muito ruim ou muito bom, envolvendo uma pessoa negra, muitas pessoas, principalmente as racistas, devem se perguntar o por que de tanta atenção dada àquele fato ou àquela pessoa. Certamente devem pensar que é um exagero, tanto as manifestações causadas pela comoção, quanto as de exaltação, relacionadas a uma pessoa negra, ao que lhe aconteceu ou lhe acontece; por certo quando se trata de algo ruim, muitas devem dizer, como já ouvi de um homem branco, que é vitimismo.

      Mas é porque não se colocam no nosso lugar; não tem e nem se põe na nossa pele, são insensíveis à nossa causa, até porque se são racistas, declarados ou não, têm por nós total desprezo, têm por nossas causas, por nossa dor, por nossa importância e pelas nossas importâncias completa indiferença. 

    Se acham melhores que nós, se julgam superiores, como se fôssemos de espécies diferentes; tratam melhor qualquer ser de outra espécie, que a nós, como se a nossa raça, a cor da nossa pele, o fato de nossos antepassados terem sido escravizados, nos marginalizassem; enquanto obviamente, foram e somos vítimas desse crime chamado escravidão, como de tantos outros aos quais nos submetem, os quais são cometidos contra nós o tempo todo, todos os dias de nossas vidas, em praticamente em todos os lugares por onde andamos, de maneiras declaradas, de maneiras veladas, com caras e bocas, com olhares e também com ausência deles, sim com ausência de um olhar, porque muitas das vezes, para demonstrar seu desprezo por nós, muitos nos ignoram, como se fôssemos invisíveis não nos põem os olhos.

      E embora nós negros não sejamos ainda tão unidos quanto deveríamos; tenham certeza de que o que acontece a um de nós, acontece a todos, o que fazem com um, fazem com todos, os benefícios ou os malefícios causados a um, direta ou indiretamente, são causados a todos, porque tudo o que se faz a uma pessoa negra, não faz apenas àquela pessoa ou não faz à pessoa apenas, mas sim à raça, à nossa raça, à nossa cor; porque a verdade é que a aversão não é pura e simplesmente à pessoa, porém à cor da pele, à raça, portanto a atitude daquele policial americano branco que culminou na morte do também americano, negro, George Floyd, foi uma clara demonstração de desprezo e ódio, não a um homem negro somente, o que por si só já foi e sempre será horrível o bastante, mas à raça, à cor da pele de George Floyd, com isso, quando aquele policial ajoelhou sobre o pescoço dele, sufocando-o até à morte, ele estava expressando o seu total desprezo, não puramente pela vida de Floyd, mas por todas as vidas negras, que nem precisariam ser classificadas assim, porque vidas, são vidas.

      Quando ele, o policial, asfixiou George Floyd, na realidade ele asfixiou toda uma raça, todo um povo, o povo negro, certamente essa deve ter sido a sua sensação, isso deve ter lhe dado um sarcástico gosto; quando ele estava asfixiando Floyd, ele estava asfixiando a raça, o povo que ele despreza, ali ele estava exprimindo os seus sentimentos para com os negros; consciente ou inconscientemente, é isso sim, quando se mata os negros como se tem matado, quando se faz com os negros o que tem sido feito ou o que sempre se fez, mais do que matar ou fazer a pessoas, tem matado uma raça, um povo, tem feito a uma raça, a um povo e se por racismo, então é intencional; tendo uma real consciência disso ou não, é por isso que tantas pessoas em todo o mundo se manifestaram, se manifestam e não só pessoas negras, diga-se de passagem, essa é a mais genuína causa de todas as reações e de todas as manifestações. Quando se mata um George Floyd, se mata na realidade todos nós negros, quando se atira sete vezes pelas costas em um Jacob Blak, se atira sete vezes pelas costas em todos nós negros, é o que fazem, é de fato o querem, essa é a intenção.

      Nos privam e querem cada vez mais nos privar de tudo, até do direito à vida; praticamente tudo para nós negros ultrapassa os limites do difícil; de modo que quando um de nós consegue alcançar uma posição de destaque na vida, quando consegue galgar de maneira pública e notória, representa a todos nós, a todos os demais, a realidade dos negros é tão difícil, tão cruel, que aquele que vence, não vence por e para si só, mas por e para todos, o alcançar  de um, é o alcançar de todos, de toda uma raça, a vitória de um negro, é a vitória de toda a raça negra, daí a importância da tão clamada representatividade. 

      Por isso, o porque de tudo envolvendo o Pantera Negra, envolvendo Chadwick Boseman, por isso, o porque de todas as reações, de todas as manifestações relacionadas a ele, ao seu trabalho, aos personagens que fez, em particular o principal deles: o Pantera Negra, à sua vida, à sua história, à sua morte; por isso e por tudo, o porque de tanto pesar pelo seu prematuro desaparecimento. Ele não apenas interpretou um super herói e o primeiro super herói negro, ele foi como tal, nos encheu de orgulho, nos representou, representou a nossa raça; se revelou ao mundo como um exemplo de dignidade, além de resiliência e força, adjetivos que modéstia à parte, nos são bem peculiares, por uma questão de sobrevivência.             

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